Denúncia contra Janones por ‘rachadinha’ pode ir ao plenário da Câmara; rito é inédito
A representação contra o deputado federal André Janones (Avante-MG) por possível prática de “rachadinha” foi arquivada pelo Conselho de Ética da Câmara, mas parlamentares de oposição querem levar o processo disciplinar, que pode resultar na cassação do mineiro, ao plenário da Casa. É o que solicita um recurso apresentado pela deputada federal Bia Kicis (PL-DF) e subscrito por mais 62 pares. O rito é inédito na história da Câmara.
“Recorremos porque achamos a decisão do Conselho de Ética bastante injusta e equivocada”, diz Kicis ao Estadão. “Vamos esperar que o plenário faça o seu papel”. Se aprovado, a cassação de Janones poderia ter a designação de um novo relator e retornar à fase de instrução – ou seja, coleta de testemunhos e provas.
Denúncia e arquivamento
Em novembro de 2023, veio à tona um áudio de André Janones datado de fevereiro de 2019. Na gravação, o então deputado federal diz ao seu gabinete que alguns funcionários estavam prestes a “receber um pouco de salário”. Estes assessores, por sua vez, o “ajudariam” a pagar dívidas de uma campanha a prefeito.
A “ajuda” sugerida pelo parlamentar se enquadra na prática de “rachadinha”, um tipo de desvio de dinheiro público em que o servidor é cooptado a repassar uma parte de seu salário de volta ao político que o contratou. Janones nega que tenha orientado o estorno dos vencimentos.
Após a divulgação do áudio, o Partido Liberal (PL) solicitou a cassação do mineiro, que também se tornou alvo de um inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF). Em 5 de junho, o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-RJ), relator da representação do Partido Liberal que poderia cassar Janones, emitiu um parecer contrário ao pedido, e foi acompanhado no Conselho de Ética por 12 votos a 5.
Aliado de Janones, Boulos alegou que a eventual prática de “rachadinha” já estava sendo apurada pelo Judiciário, a quem compete a conclusão do inquérito. Além disso, o deputado do PSOL argumentou que Janones não incorreu em “quebra de decoro parlamentar” pois a gravação de áudio seria de uma data na qual o mineiro ainda não tinha assumido o mandato. Esta alegação não procede, pois o áudio atribuído a Janones é de 5 de fevereiro de 2023, quatro dias depois de 1º de fevereiro, dia da posse dos deputados federais. Além disso, a sessão inaugural do Congresso havia sido realizada na véspera da gravação, no dia 4.
Recurso de Kicis é inédito
O recurso é um tipo de ofício com o qual se solicita que uma proposição de caráter conclusivo seja remetida ao plenário da Casa. Os projetos que tramitam de forma “conclusiva” são aprovados pela Câmara sem a necessidade do aval do plenário, como é praxe, mas esta dispensa pode ser suspensa por meio do recurso.
O pedido de Kicis, analogamente, solicita que o parecer de Boulos seja apreciado por todos os parlamentares, passando a ser passível de anulação. Dos 62 signatários do recurso, 40 são do Partido Liberal, a sigla autora da representação contra Janones.
A peça já foi encaminhada a Arthur Lira (PP-AL), presidente da Casa, a quem cabe a inclusão do recurso na ordem do dia, ou seja na relação de itens que podem ser votados, em uma determinada sessão, pelos deputados federais. No entanto, pelo ineditismo da medida, não há consenso, nos termos do Regimento Interno e do Código de Ética, sobre o trâmite adequado para o ofício.
Não há certeza, por exemplo, quanto ao quórum necessário para a aprovação do recurso, que à escolha de um novo relator no Conselho de Ética e um retorno do processo à fase da coleta de provas e testemunhos.
Estadão Conteúdo
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