Fabricante da Covaxin nega autoria de documentos entregues pela Precisa ao Ministério da Saúde
Foto: Vishal Bhatnagar/NurPhoto/Getty Images
A farmacêutica Bharat Biotech, fabricante da vacina indiana Covaxin, negou “veementemente”que tenha emitido documentos apresentados pela Precisa Medicamentos ao Ministério da Saúde durante o processo de aquisição do imunizante. A documentação citada faz parte do contrato assinado em 25 de fevereiro entre o ministério e a fabricante.
Os documentos a que se refere a Bharat foram encaminhados pela Precisa à Saúde como se fossem de autoria da farmacêutica. “Fomos informados recentemente que certos documentos, supostamente emitidos por executivos da empresa, estão sendo divulgados online. Gostaríamos de afirmar enfaticamente que esses documentos não foram emitidos pela companhia ou seus executivos e, portanto, negam veementemente os mesmos”, informou a fabricante nesta sexta-feira (23) por meio de nota.
O Brasil chegou a empenhar R$ 1,6 bilhão para a aquisição de 20 milhões de doses do imunizante. Mas, em meio a uma série de investigações envolvendo a contratação, o processo acabou suspenso. A CPI da Covid, a Polícia Federal, o Ministério Público Federal e o Tribunal de Contas da União (TCU) apuram o caso.
A Precisa Medicamentos se apresenta como a representante entre a Bharat e o governo brasileiro na contratação da Covaxin. A empresa é a única intermediária, nas vacinas negociadas pelo Brasil, que não possui vínculo com a indústria do ramo. Também chama atenção o fato de o imunizante ser o mais caro negociado pelo governo – custou US$ 15.
Nos documentos cuja autoria é negada pela Bharat, a Precisa fica autorizada a ser o “representante legal e exclusivo” da fabricante no Brasil, com autonomia para negociar preços e condições de pagamento.
Nesta sexta, a Bharat Biotech anunciou que rescindiu o memorando de entendimentos para vender a Covaxin para a Precisa Medicamentos. A fabricante não revelou o motivo.
A Precisa divulgou uma nota sobre a rescisão, mas não mencionou especificamente a afirmação da Bharat Biotech sobre os documentos não reconhecidos pela farmacêutica. “A Precisa jamais praticou qualquer ilegalidade e reitera seu compromisso com a integridade nos processos de venda, aprovação e importação da vacina Covaxin”, diz a nota da empresa brasileira.
Erros de grafia e autonomia
A Bharat apresentou dois documentos não reconhecidos pela empresa. Um deles – uma declaração de inexistência de fatos impeditivos – apresenta erros de grafia no nome da própria farmacêutica, registrada como “Bharat Biotecb” (veja abaixo).
Já a segunda documentação indica que a Bharat Biotech autoriza a Precisa Medicamentos “para ser nosso representante legal e exclusivo no Brasil com poder de receber todas as notificações do governo, sendo responsável administrativamente e judicialmente por meio de sua legislação nacional”.
Há, ainda, a autorização para a Precisa participar de todos os processos de aquisição da Covaxin pelo Ministério da Saúde, “negociando preços e condições de pagamento, assim como datas de entrega e todos os detalhes pertinentes à operação”.
Nos documentos, constam a suposta assinatura do diretor-executivo da farmacêutica, Dr Krishna Mohan Vadrevu, com referência ao dia 19 de fevereiro deste ano.
‘Possíveis crimes’
A senadora Simone Tebet (MDB-MS), líder da bancada feminina e participante frequente da CPI da Covid, afirmo que os documentos contestados pela Bharat Biotech podem indicar “possíveis crimes” cometidos pela Precisa.
“Nós estamos diante de 2 possíveis crimes: crime de falsidade de documento privado e crime de falsidade ideológica. Com que objetivo? Falsificar os documentos em nome da Bharath para dizer, num deles, que talvez seja o item mais grave, que a Precisa tinha plenos poderes para negociar o preço da vacina e condições de pagamento”, afirmou a senadora.
Ainda segundo Tebet, o episódio confirma suspeitas da CPI. Ela lembrou que uma das suspeitas em torno das negociações da Covaxin era uma invoice (nota fiscal) que previa pagamento adiantado de US$ 45 milhões pela primeira remessa de doses.
O pagamento, segundo a nota, seria feito para uma terceira empresa, a Madison, com sede em Singapura. O problema é que o contrato da Covaxin não previa pagamento adiantado.
“Em conjunto com as invoices que apresentamos, que tem suspeita de fraude também, confirma a tese da CPI de que eles estavam, primeiro, querendo receber o pagamento antecipado, e que a primeira parte, R$ 200 milhões, seria para ir parar no paraíso fiscal [Singapura]. Provavelmente como parte do pagamento de propina para uma série de pessoas que agora a CPI tem que descobrir quem são”, concluiu a senadora.
‘Obstrução de informações’
A CPI da Covid apura o contrato da Covaxin após depoimento dos irmãos Luis Miranda (DEM-DF), deputado federal, e Luis Ricardo Miranda chefe do departamento de importação do Ministério da Saúde.
Luis Ricardo constatou supostas irregularidades na documentação, entre as quais a previsão de um pagamento antecipado de de US$ 45 milhões, o que não estava previsto em contrato. A cúpula da comissão relatou ter enfrentado dificuldades em acessar o contrato da Covaxin e chegou a apontar para uma “obstrução de informações” por parte do Ministério da Saúde.
O vice-presidente da CPI, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), alertou que o colegiado poderia fazer uma busca e apreensão na pasta para acessar o material – depois disso, a documentação foi concedida.
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