Troca de comando no Senado revalida hegemonia do PMDB na Casa
Saiu um peemedebista citado na Lava Jato. Entra outro colega de partido, também citado por delatores na mesma investigação. Se confirmado o script previsto pelas cúpulas dos principais partidos com representação no Senado, assim deverá ser a troca de comando na Mesa Diretora da Casa nesta quarta-feira. A presidência sairá das mãos do alagoano Renan Calheiros e passará para as do cearense Eunício Oliveira, atual líder do PMDB.
O primeiro responde a três inquéritos na operação e é réu em um processo. O segundo teve seu nome mencionado em ao menos duas situações, mas, por enquanto, nenhuma investigação foi aberta contra ele dentro desta operação no Supremo Tribunal Federal.
Renan deixa a cena depois de quatro anos comandando o Senado. Nesse período, viveu passagens emblemáticas: descumpriu uma ordem judicial do Supremo Tribunal Federal e conduziu um impeachment presidencial. Agora, não ficará sem papel de destaque. Ele deverá assumir o cargo que hoje é o de Eunício, o de líder da bancada do PMDB.
O partido deve assumir a presidência do Senado, um dos cargos mais poderosos da República, que entra inclusive na linha sucessória da presidência da República (em caso de ausência do presidente da Câmara). O PMDB sempre foi soberano no Senado por ter a maior bancada da Casa. A hegemonia do partido é tamanha que desde 1985 apenas dois dos 14 senadores que presidiram a Casa não eram filiados a essa legenda. Foram eles: Antônio Carlos Magalhães (do extinto PFL), entre 1997 e 2001, e Tião Viana (PT), que cumpriu um mandato tampão entre outubro e dezembro de 2007. Geralmente, o presidente é escolhido entre um dos membros do partido que tem a maior bancada.
Além do partido, Renan e Eunício têm em comum um jogo duplo feito nos últimos anos. Renan foi aliado de Dilma Rousseff (PT) até ela sofrer impeachment, mas acabou votando por sua cassação. Ele a abandonou no dia do julgamento dela no Senado – apesar de ter negociado uma saída que mantivesse seus direitos políticos. Já Eunício foi parceiro fiel da presidenta no Senado, mas a deixou antes mesmo do processo chegar ao plenário da Casa. O desgaste da relação com a petista começou com a falta de apoio à candidatura dele ao governo do Ceará em 2014, quando perdeu para Camilo Santana (PT), e se intensificou quando a gestão dela estava perto do fim.
Mais do que consolidar a hegemonia do partido, a eleição de Eunício reforça a gestão Temer e a relação favorável do presidente com o Congresso. Desde maio do ano passado, com o novo governo, tanto Renan quanto Eunício têm livre acesso ao gabinete do correligionário Michel Temer e essa é uma das condições para que a eleição seja considerada favas contadas. Com apoio de ao menos 50 dos 81 senadores, dificilmente Eunício não será eleito, em um pleito cujos votos são secretos. Apenas dois nomes apareceram até agora como eventuais concorrentes, José Medeiros (PSD-MT) e Roberto Requião (PMDB-PR).
O matogrossense lançou um balão de ensaio, reuniu-se com Temer para dizer que concorreria com Eunício e acabou conseguindo indicar o diretor da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Foi uma espécie de prêmio de consolação para que ele não criasse problemas para a base governista. Assim, a tendência é que Medeiros retire sua candidatura.
No caso do senador paranaense, ele próprio não lançou oficialmente seu nome. Disse apenas que apoiaria um candidato que encampasse propostas que dessem um caráter mais democrático ao Legislativo. Se ninguém “comprasse” suas ideias, ele próprio poderia ser o concorrente. “Eu até poderia propor a minha própria candidatura. [Seria] absolutamente inviável, diga-se de passagem, em um plenário, que se sustenta fisiologicamente pelo governo”, afirmou. Requião, uma voz dissonante no PMDB, diz, sem citar nomes, que o Senado possivelmente continuará sendo comandado por zumbis. “É uma Mesa Diretora de mortos-vivos. São zumbis que não vão poder contestar nenhuma medida do STF porque são investigados”, afirmou.
A quase aclamação de Eunício estava prestes a ocorrer até mesmo com o apoio do PT. Um acordão envolvendo os petistas chegou a ser costurado, mas sofreu resistências da militância e de 6 dos 10 senadores da legenda. Os contrários ao acordo dizem que não poderiam apoiar quem votou a favor do impeachment, a quem eles chamam de golpistas. O combinado inicial era o seguinte: a bancada (a terceira maior do Senado) apoiaria a eleição de Eunício desde que pudesse um dos petistas ocupasse um cargo na Mesa Diretora. O objetivo deles era o de continuar tendo alguma influência nas decisões da cúpula do Senado – hoje eles ocupam a primeira vice-presidência e a quarta secretaria – e de ter espaço para oferecer cargos a alguns de seus filiados que perderam suas funções com o fim da gestão Rousseff. Ao todo, são quase 200 cargos comissionados em jogo.
Com uma mão na presidência, Eunício minimizou as suspeitas que pesam contra si e disse que não tem nenhuma preocupação. Ele é acusado por um delator e ex-diretor da Hypermarcas de ter recebido 5 milhões de reais na campanha de 2014 por meio de contratos fictícios. “Ninguém pode impedir que terceiros falem, criem, inventem e até mintam”, disse ao jornal O Estado de S. Paulo. Seu advogado, Antonio Carlos de Almeida, já disse em outra ocasião que as acusações são baseadas em pressupostos falsos.
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